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  • Por: Márcio Botelho
  • Publicado em: 13 de setembro de 2022

Uma breve história dos jogos de guerra

Angel Fury, o próximo lançamento da MeepleBR, é um jogo de tabuleiro que carrega consigo diversos elementos dos jogos de guerra, os famosos wargames, que fazem bastante sucesso, em especial nos países de língua inglesa como Estados Unidos e Inglaterra.

No Brasil esse tipo de produto não é tão popular assim, mas devo admitir que sempre tive um grande interesse sobre esses jogos com miniaturas coloridas, campos de batalha cheios de detalhes e que fazem você se sentir um verdadeiro general (ou almirante, no caso de jogos com temática naval).

Pesquisando para esse artigo descobri que os wargames são muito antigos, remontando ao século XVIII e à um uso muito menos ligado aos seus aspectos lúdicos.

Preparação para a guerra

Como muitas coisas no mundo dos jogos de tabuleiro, os primeiros wargames tiveram origem na Alemanha (na verdade na Prússia, um reino alemão que teve papel central na Unificação Alemã do século XIX). Em 1780 o professor Johann Christian Ludwig Hellwig desenvolveu o que viria a ser o primeiro jogo de guerra de que temos notícia: ele usou como base o xadrez, mas utilizou unidades militares reais, criou um sistema de movimentação e orientação das peças mais sofisticado, diferentes tipos de terreno (que afetariam a movimentação das tropas), bem como a possibilidade de os jogadores criarem seus próprios mapas.

Hellwig apresentou seu jogo para jovens da nobreza prussiana, uma parcela da população que compunha os escalões superiores as Forças Armadas e que via no jogo uma espécie de treinamento para situações de comando reais.

Esse jogo obteve relativo sucesso, estimulando a criação de outros jogos semelhantes na Prússia entre o final do século XVIII e o começo do século XIX. O mais bem sucedido desses jogos foi o Kriegspiel (literalmente jogo de guerra em alemão), desenvolvido para ser uma simulação realista das batalhas da época. No Kriegspiel as unidades possuíam pontos de vida, podendo sofrer danos parciais, haviam diversas tabelas com as estatísticas de combate como alcance, movimentação e dano e os mapas já não eram uma grade quadriculada, mas sim simulações em escala de campos de batalha reais.

O Kriegspiel foi tão popular entre os oficiais prussianos, que muitos observadores da época atribuíram o sucesso da campanha militar prussiana durante a Guerra Franco-Prussiana (1870 – 1971) ao fato de que os generais teriam simulado as batalhas com o Kriegspiel.

Miniaturas deixam tudo mais legal

Como era de se esperar, os jogos de guerra dos prussianos não tinham miniaturas. As tropas eram representadas com peças de madeira pintadas nas cores dos exércitos e com alguns símbolos que ajudassem a identificar o tipo da unidade (marcações simples como listras, estrelas, pontos e etc).

Felizmente alguém teve a ideia de adicionar miniaturas aos jogos, pois não é todo mundo que tem a disposição de ficar movendo peças de madeira, consultando tabelas e fazendo medições de régua para simular os combates.

Segundo os registros mais precisos, essa adição de miniaturas aconteceu no Reino Unido e envolveu aristocratas, profissionais liberais e outras figuras abastadas que tiveram contato com o Kriegspiel dos prussianos e que resolveram deixar a experiência mais interessante em termos visuais. Escritores famosos da Era Vitoriana, como Robert Louis Stevenson e H. G. Wells, desenvolveram sistemas de batalha, miniaturas e adereços para suas jogatinas. Devido ao fato de que o Reino Unido era uma potência naval na época, muitos dos jogos tentavam simular batalhas entre esquadras de navios.

A introdução das miniaturas também criou o hobby dentro do hobby: surgiram as primeiras pessoas que se dedicavam a pintar miniaturas para deixá-las ainda mais realistas e detalhadas. Naquele tempo, as miniaturas eram feitas de madeira, cortiça, latão e outros metais de baixo custo e maleáveis.

Jogos de escaramuça (skirmish games)

Um fato curioso sobre os jogos de que falamos até agora é que eles eram basicamente livros. Não havia mapas impressos separadamente, dados, réguas ou peças/miniaturas acompanhando o conjunto de regras. O jogador precisaria ler o livro e se esforçar para adquirir todos os componentes necessários para realizar uma partida.

Isso só mudou a partir da década de 1950, quando algumas empresas decidiram vender dentro de uma única caixa os manuais de regras, os mapas e todas as peças necessárias para simular as batalhas no conforto do lar. Tactics (1954) é considerado o primeiro jogo de tabuleiro de guerra moderno e abriu as portas para o surgimento de diversos produtos semelhantes.

Nesse contexto, destacou-se a Avalon Hill, empresa fundada em 1952 por Charles S. Robert, companhia que se dedicou a desenvolver e produzir uma série de jogos de guerra para o grande público. Os títulos da Avalon Hill eram em sua maioria simuladores de batalhas históricas, atraindo a atenção de entusiastas da história militar e que queriam recriar a trajetória de grandes generais como Napoleão ou Robert E. Lee.

Fazendo um pequeno salto no tempo, já nos anos 1970, ocorreu a popularização de um outro estilo de jogo de guerra: os skirmish games (jogos de escaramuça em uma tradução livre). Nesse tipo de jogo as peças não representam pelotões ou grandes unidades militares, mas sim indivíduos específicos com habilidades e capacidades únicas. Os skirmish são muito populares até os dias de hoje, como é o caso das séries Warhammer fantasy e Warhamme 40.000, e também serviram de base para o desenvolvimento dos jogos de RPG (o primeiro sucesso comercial de Gary Gygax, o criardor do Dungeons & Dragons, se deu com Chainmail, um skirmish game de fantasia medieval).

Tecnologia e jogos de guerra

Com o desenvolvimento dos videogames e computadores, muitos fãs dos wargames acabaram direcionando sua atenção para as possibilidades trazidas pelos jogos eletrônicos.

A década de 90 foi cheia de títulos interessantes para os fãs da estratégia militar: Command & Conquer, Warcraft, Starcraft, Total Annihilation e Dune II: The Building of a Dinasty, são bons exemplos de jogos de sucesso no estilo RTS (sigla para real time strategy, ou em tradução livre, estratégia em tempo real).

Apesar da popularidade desse tipo de produto, os wargames não desapareceram das prateleiras das lojas especializadas. Ainda hoje, em plena era dos smartphones e da internet, ainda existe uma base fiel de entusiastas de jogos de guerra, em especial nos EUA e no Reino Unido, países nos quais os fãs dos wargames se reúnem regularmente em clubes ou lojas para praticar suas habilidades como comandantes militares.

Trazendo a batalha para o tabuleiro

A fabricação de miniaturas para jogo se beneficiou com a popularização e o barateamento de tecnologias que facilitaram a fabricação de peças com bom acabamento em plástico e resina. Por conta disso, o uso de miniaturas em jogos de tabuleiro vem aumentando nos últimos anos.

Essa presença das miniaturas fez com que os board games se aproximassem dos jogos de guerra. Um jogo como Fire Team Zero evidentemente foi influenciado pelos skirmish games e suas batalhas com soldados únicos e cheios de talento; Memoir’44 é um belo exemplo de jogo que simula a movimentação das tropas e as batalhas em cenários históricos; mesmo um jogo como The Great Wall, um coop do estilo euro, se beneficia claramente com a presença de miniaturas para aumentar o nível de imersão dos jogadores na partida.

Essa mescla entre jogos de tabuleiro e wargames está presente em Angel Fury: a movimentação de tropas e os confrontos entre soldados são feitos através do uso de pontos de ação, do gerenciamento de recursos e de um deckbuilding bem desenvolvido e que exige do jogador muito planejamento para conseguir obter o melhor resultado das suas tropas.

Jogos de tabuleiro como os citados acima podem contribuir para a popularização dos jogos de guerra, trazendo mais entusiasta para o hobby, ao mesmo tempo em que contribuem para o surgimento de novas e interessantes mecânicas para os fãs de board games.

Márcio Botelho

Raça: Humano. Alinhamento: caótico e bom. Classes: Historiador 6, Crítico literário 4 e Nerd 10. Pronto pra dar espadada de fogo na cabeça de capiroto.

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